sábado, novembro 11, 2006

OCUPAR O TEMPO

fiel jardineiro
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"...Eu não tenho tempo para nada senão para o que me faz escapar às saudades..." Pedro Paixao, in "Asfixia"

"Terra"

VOLVER

Volver

Antes de te sentir, antes de te ver... pressenti. Encontrei-te no cheiro quente do perfume que ainda teimas em usar num cocktail com o after-shave. Reencontrei-te nas notas que sobre ti guardei. De olhos fechados revi o filme onde um dia fomos protagonistas. Antevi o descer do pano.

Voltei-me.. e lá estavas, como te recordava. Galã e seguro. Só o olhar não era meu. Só as mãos que um dia me procuravam, se enroscavam no fundo dos bolsos para onde atriraste as recordações. Só.

Usaste a arma facil, as perguntas comezinhas.... como forma de quebar o gelo. O cão, o sofá, o trabalho... oh como evitaste o essencial. Como evitamos falar sobre o que desconheciamos. Como fomos cobardes.

Revolves o cigarro na ponta dos dedos e procuras na multidão a resposta. Cada olhar que se cruza é uma deixa de vulnerablidade. sabes que te leio no olhar... sabes que te percebo no gélido tom em que colocas a voz. sabes que com todos os acessorios te reconheço na essêcia.

E despedes-te com o social.."dá noticias". Esperaste que pedisse para ficares, saiu-me "tem juizo". Foste. Ficou o cheiro. O teu cheiro.

"Fogo"

SINTONIA




...."vejo-os agora como estrelas cruzando-se sobre o vazio profundo de um firmamento de cartolina azul. Duas vibrações dispersas de uma mesma luz vã, desenhando breves trajectórias de fogo sobre um céu incombustivel"...
Inês Pedrosa, nas tuas mãos
"Fogo"

FAZES-ME FALTA


Um livro belíssimo e um sentimento próximo.


"Terra"

NADA MAIS FALSO


Longe da vista, longe do coração.

"Terra"
fotografia dotectodomundo

POSTAL

fotografia de Olga Gouveia
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"...Um carteiro é um herói melancólico que ignora o que transporta, se lágrimas, se promessas pungentes, se simples contas para pagar. E a letra escrita por mao humana num belo postal ilustrado ou numa folha impecável é ainda uma singela prova de uma civilizaçao que persiste como pode, um rosto vivo que se desvia da esterilizada igualdade, da indiferença de tudo com tudo..." Pedro Paixao, in "Asfixia".





"Terra"

quinta-feira, novembro 09, 2006

Embuste

«O embuste era uma forma de evitar atritos e as pessoas coabitavam sem repugnância na regra da habituação. Julgavam comunicar e o que faziam era habituar-se»

Agustina Bessa-Luís
"fogo"

CORAGEM

"Todos os dragões da nossa vida são talvez princesas que esperam ver-nos um dia belos e corajosos. Todas as coisas aterradoras não são mais, talvez, do que coisas indefesas que esperam que as socorramos". Rainer Maria Rilke

"Terra"

quarta-feira, novembro 08, 2006

Alucinação



"ultima chamada para voo 251" No gélido corredor do Sá Carneiro olhou pelo vidro.. pela ultima vez encontrou o seu olhar com as luzes da pista... vermelho, verde, amarelo... apertou o bilhete na mão transpirada e fechou os olhos. Respirou fundo enebriada ainda pelo cheiro da saudade. Relembrou o rio, o coado da luz de Outubro, as gaivotas que planavam na marginal, das margaridas que nessa mesma tarde escolheu, colheu, e docemente amarrou. Brancas...sempre brancas.
Maquinalmente dirigiu-se para a porta de embarque. No mp3 soava Stanley Clark. Um almoço... se ele tivesse aceite o convite provavelmente estaria agora em terra firme.... e não naquele autocarro cheio de mochilas.
"Boa noite" Fila 35 lugar F" janela, janela janela... esperava enquanto percorria as caras e os numeros do Boing. Enfim... janela. Arrumou as tralhas no compartimento e apertou o cinto. o ar condiciondado começou a trabalhar... como enjoava com aquele cheiro. esperava-a madrid e depois, muitas horas sob o Oceano.
Teria recebido as flores? Perceberia? O medo, a informação velada? A cidade despedia-se na sua insignificancia. transcendia-se pela fuga... todas as luzes da cidade que acolheu. E o Rio... esse rio para onde deveria estar a olhar de um primeiro andar, e não sob as nuvens. Onde se aninharia na cumplicidade e não naquela manta... e chocolate... teria chocolate certamente, maravilha das maravilhas.. fondant de chocolate?
Fechou os olhos a aconchegou-se na musica... Jorge Palma acariciou-lhe o espirito. Tinha fugido... só agora se apercebera. Justificou-se racionalmente... mas tinha medo. De si. Do que desconhecia em si.
Sentia agora o sono. A corrida para o avião não a tinha ainda deixado render-se ao cansaço que sentia sempre depois de chorar! Enquanto escreveu o bilhete, e acariciava as delicadas petalas... desprendia as palavras, em cadência com as lagrimas que caiam. Rolavam pela face... terminando na esperança do reencontro.
Agora, por cima do Atlantico ... lembrou-se que se tinha esquecido... de trazer o coração! Ficara na marginal do douro. Esquecido? não! Entregue.
"Fogo"

ALUCINAÇÃO


Ele tinha, delicadamente, declinado um convite para almoçar. "Gostava de te levar a um restaurante onde a comida é, apenas, um pretexto. A cor, a textura e o paladar são apenas a introdução para um tempo bem passado. Fica na marginal. E quando os teus olhos se fartarem de ver ao espelho nos meus, sempre poderás reflectir a tua timidez nas águas tranquilas do rio e, quem sabe, nele descobrir peixes verdes." - concluía ela o convite, desta forma poética.
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Agora, tentando redimir-me da nega matutina e do temor que de mim se apoderou pela forma inesperada e simultaneamente desejada do seu apelo, espero-a para jantar. No loft ribeirinho que há meia dúzia de meses comprei, decorado de forma minimalista, de cores claras e confortável, coloco na aparelhagem Stanley Clarck, num CD fantástico gravado ao vivo "At the Greek". O jantar, exclusivamente feito por mim, está pronto...umas ostras cozidas "ao" molho de limão, irão abrir as hostilidades, aproveitando o Veuve Clicquot aberto anteriormente para espairecer o espírito. Depois umas perdizes estufadas com um puré cremoso de batata, acompanhado de uma couve-flor gratinada. Para apurar os sentidos e libertar as amarras deste navio que é o desejo, nada melhor do que um vinho tinto, quente, do douro. No caso um Quinta Vale D. Maria de 2003. Para sobremesa, um "fondant" de chocolate coberto por umas natas semi-frias...todo este ritual celebrado com uma música eléctrica mas, simultaneamente, inebriante de Nitin Sawhney.
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Quando a campainha tocou estava eu detido em pensamentos semi-eróticos ou, pelo menos, sensuais, pensando no bom que seria apreciar um café estupidamente forte, bebido numa caneca grosseira, seguido de um Cognac de boa colheita, na varanda da casa - do loft, digo - enrolado num cobertor macio, aconchegado num poof...com o mar à minha frente, iluminado pela lua e pelas estrelas. Melhor, por uma em especial. Por ela. Aqui a música seria outra, a banda sonora teria que ser apelativa, teria de ser provocadora, teria de tocar a rebate o alerta dos sentidos...ao fim e ao cabo que nos desse a sensação de liberdade, a possibilidade de voar nas assas do deslumbramento do som rumo à realização do "encontro". O rock psicadélico dos Pink Floyd?..podia ser mas...não, tinha que ser algo mais forte...algo "pulp fictioniano"...sim, iriam rodar e rodar e rodar as várias versões do "Girl, You'll be a woman soon"...e pedir-lhe que me entregasse a alma e o fizesse entregando-se-me...sem condições, nem tempo. Toda. Só assim a queria. Completa.
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Abro a porta com um sorriso confiante e másculo, quando dou de caras com um homem impecavelmente vestido, o qual me pergunta o nome e a quem respondo, surpreendido, maquinalmente. "Esta encomenda é para si." - disse ele, entregando-me um ramo de Margaridas brancas, como o branco mais puro que alguma vez me foi dado ver. "A menina deve gostar muito do Senhor", continuou para concluir, "quase perdeu o avião por sua causa". Avião?..Menina?..Seria ela?..Serias tu?..Fechei a porta de uma forma, um tanto ou quanto, atabalhoada e, de garrafa de Champagne na mão - pronta a entrar de imediato na goela - abro o envelope e retiro o bilhete que dizia, tão assustadoramente, o seguinte: "Meu amor - acho que nunca te chamei assim - aceita estas flores como um pedaço de mim; plantei-as, trateia-as e colhi-as eu própria no meu jardim. Retira-lhes as pétalas e deita-as nas piscina que aí tens e de onde consegues ver o céu estrelado no horizonte da foz, onde o rio se funde com o mar. Depois, abraça a água e deixa que elas envolvam o teu corpo nu. Por fim olha o céu. Hás-de vê-lo todo, tão grande, enorme. Na imensidão do desejo e sensações que de ti se apoderarem hás-de descobrir, entre todas as estrelas, uma que brilhará mais do que todas as outras. Serei eu. Serei tua. A tua estrela." As lágrimas corriam-me pela cara abaixo, mas tinha de arranjar forças para terminar aquela leitura, quase, necrológica. Os seu olhos verdes pareciam-me agora tão distantes, as covinhas quando sorria e...aquela figura de mulher que me comprometi a satisfazer...compromisso meu...comigo...Tão longe. "...Não estou a fugir, nem tão pouco a dizer adeus. Depois destes dois desencontros havemos de nos Reencontrar...algures. Só por uma razão: porque tu me queres e eu tremo de vontade em te ter. Mas não agora. Não. Quando o caminho não tiver pedras e o céu expulsar todas nuvens. Sei que hoje perdi um momento, mas apurei o amor, o amor que sinto por ti. E, como dizia o Drummond de Andrade, não há falta na ausência. Não te esqueças...a estrela que mais brilhar...sou eu, que em ti estarei quando abraçares a água e beijares as pétalas. Um beijo grande, para sempre, muito...meu amor".
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Arrasado, aliviado, feliz. Que turbilhão de sentimentos e sensações. Tinha-a conquistado e o desencontro era apenas espacial. Tinhamos percebido o essencial, tinhamo-nos entregue à transcendência. Pertenciamo-nos irremediavelmente. A consumação deste amor, pleno de desejo, dar-se-á algures, no tempo e no espaço, provavelmente num dia de chuva em que ambos involuntariamente nos econtremos num passeio solitário à beira-mar, à beira de um qualquer mar, à beira de um qualquer oceano. E nessa altura, a estrela do céu há-de ter uma forma bem caprichosa...há-de ter a forma de uma ramo de margaridas brancas, cujas pétalas substituirão as gotas da chuva...no preciso momento em que desistirmos de ser dois.
"Terra"

FUSÃO DE ELEMENTOS

O rio não saberá na sua nascente que se diluirá na imensidão do mar, mas…tem já uma disposição de ir ao encontro…de entrega…de dádiva…de paixão pelo “splash”. Directamente proporcional, diga-se, à vontade que o mar tem de o acolher, de o fazer entrar em si…de fazer com que ambos se tornem num só elemento.

"Terra"

Porto

emprestada pelo tecto

Sophia

"Se tanto me dói que as coisas passem
É porque cada instante em mim foi vivo
Na busca de um bem definitivo
Em que as coisas de Amor se eternizassem"

Sophia de Mello Breyner Andresen

terça-feira, novembro 07, 2006

NÃO SOMOS TODOS IGUAIS

"Não faças aos outros aquilo que gostarias que te fizessem a ti. Os seus gostos podem ser diferentes dos teus."
Oscar Wilde

Não faças aos outros aquilo que não gostarias que te fizessem a ti. O princípio é bonito, socialmente aceitável e politicamente correcto. Mas será que não parte de um preconceito absolutamente tenebroso? De facto a execução prática desta abstracção obriga-nos a ver o outro como um igual e não, como na minha opinião dever ser…um semelhante. E se ainda poderia aceitar a existência indivíduos iguais, já me parece absolutamente de arredar a hipótese, quando de pessoas se trata. A singularidade do indivíduo é cada vez mais esbatida, deixando ao acessório a terrível ilusão de uma standartização democrática mas falaciosa. A riqueza da singularidade do eu é substituída pela falsa presunção de uma terrível igualitarização que esquece e despreza as diferenças. O outro, fundamental na formação do eu, por ser cada vez mais igual é desprezado, sobressaindo deste facto uma hipervalorização individualista que se julga capaz de definir axiologicamente uma existência humana. Assim, a minha sugestão vai no sentido de que se olhe o outro e para o outro tal qual ele é e que se tente a aproximação pela diferença rejeitando, de uma vez por todas, a tirania da igualdade. Afinal Oscar Wilde não estava assim tão errado, ou estava?
"Terra"

ACESSÓRIOS


Num mundo cada vez mais cinzentão são eles – acessórios - que se distinguem e que distinguem. Ainda assim mais importantes neles – M – do que nelas – W. A “farda” deles torna-os quase obrigatórios. A criatividade na indumentária delas fá-los diminuírem de importância na sua exacta proporção.



"Terra"

BUSCA




Procuro por algo ou alguém que me entregue a definição de um sonho real. Definitivamente, a perfeição não é real. E, contudo, existe. Para além das barreiras que me imponho e, por isso, inatingível. Será a perfeição o resultado da busca dos pós polvilhados pela memória? Daqueles a que atribuo o desígnio de momentos felizes? Ou acrescentará essa busca algum travo de amargura pelo seu carácter efémero?

Difícil...



"Terra"

Amanhecer

"O dia acordou estremunhado.

O sol, timido, foi suplantando uma lua jà cansada pela noite.

Sentada na praia, observou as gaivotas que começavam a brotar da garoa. Descalça sentia a areia gelada e humedecida pela maré ora vaza. Sentiu frio.Sentia-se viva!"

"Fogo"

segunda-feira, novembro 06, 2006

O primeiro

Devias estar aqui rente aos meus lábios
para dividir contigo esta amargura
dos meus dias partidos um a um
- Eu vi a terra limpa no teu rosto,
Só no teu rosto e nunca em mais nenhum

Eugénio de Andrade